Escrito em 11 de janeiro de 2010
Oi Rodrigo,
Estou escrevendo para pedir que visite a Margô.
Ela está com 70% do cerebelo lesado e seu cérebro tomado por água. Já
não fala coisa com coisa, mas tem falado muito em você. Pergunta se eu
gostei da fazenda do Digão, se eu fui à festa do Digão ou se eu recebi
o convite da comemoração dos 45 anos de casado do Digão, entre outros
tantos comentários sem sentido.
Não é difícil encontrá-la. Ela está internada no Pronto Socorro do
Hospital de Base posto 1, o da neurocirurgia. O leito da Margô fica no
último corredor á esquerda, fica bem ao lado da ala dos presidiários.
Para chegar lá você vai passar por todo o PS, basta seguir o primeiro
corredor com macas dos dois lados onde você poderá ver todo tipo de
gente doente acomodada do jeito que dá em leitos improvisados e em
condições muito precárias.
Você vai passar por homens, mulheres, crianças e idosos costurados,
enfaixados, baleados, esfaqueados, debilitados.
Alguns estarão vestindo apenas fraldas outros estarão com suas partes
íntimas expostas enquanto um familiar tenta fazer a higiene com o que
tem (quando tem), ou seja, água e papel toalha.
Passará também por pacientes deitados sobre colchões sem lençol uma
vez que a quantidade deles não é suficiente para todos. Verá leito
coberto com lençol sujo de sangue ou de urina daquele paciente que
não tem um acompanhante para cuidá-lo.
Cuidado para não tropeçar em copos plásticos ou lençóis sujos que
ficam pelo chão aguardando a moça da limpeza, ela passa uma vez por
dia e não recolhe o lençol por não ser sua função.
Verá ainda, acompanhantes que passam os dias e as noites sentados em
cadeiras tão raras que quando é sabido de uma alta todos ficam de olho
na tentativa de pegar a cadeira do que vai sair.
Nem pense em ir ao banheiro. Você pode dar de cara com um paciente nu,
deitado no chão do espaço destinado ao banho, que não tem sequer uma
porta, e, olhando com cuidado verá que a queda aconteceu por falta de
uma barra de apoio. Aconteceu com a Margô e foi muito difícil
conseguir um enfermeiro que pudesse ajudar a levantar os 90Kg dela e
colocá-la numa cadeira de plástico emprestada por uma boa alma que acompanhava um dos internos.
Não queira falar com o médico da Margô, você não vai encontrá-lo.
Desde que ela foi internada, ainda em 2009, dia 30 de dezembro, só
aparece por lá um residente que pede os exames, mas não pode fazer
nada, não tem autoridade para decidir sobre a condução do tratamento
dos pacientes.
Prepare-se. Aquele não é um lugar bom de se ver. Qualquer um que tenha
passado por lá consegue ter a clara idéia do que seja o inferno.
Alguns o chamam de Faixa de Gaza, a mim parece a sala de espera do inferno.
Mesmo assim, vá ver a Margô.
Abraços.
Lurdinha
segunda-feira, 26 de abril de 2010
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário